Instituto Pensar - Receita quer aumentar taxação de livros e diz que só ricos leem no Brasil

Receita quer aumentar taxação de livros e diz que só ricos leem no Brasil

por: Eduardo Pinheiro 


Foto: Reprodução

A Receita Federal afirma que pessoas mais pobres não consomem livros não-didáticos e defende que os produtos sejam tributados como forma de focalizar políticas públicas. A constatação do Fisco está em novo documento sobre o projeto de fusão da PIS/Cofins em um único tributo, a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS).

A proposta do governo Jair Bolsonaro (sem partido) para a CBS abre caminho para o fim dessa isenção para livros, que ficariam sujeitos à mesma alíquota de 12% que vale para os outros setores. A Receita usa dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para justificar que a isenção sobre esses itens acaba por beneficiar a camada mais rica da população.

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"De acordo com dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares de 2019, famílias com renda de até dois salários mínimos não consomem livros não-didáticos e a maior parte desses livros é consumida pelas famílias com renda superior a dez salários mínimos?, diz o documento.

Socialista comenta medida

O deputado federal Rafael Motta usou as redes sociais para criticar a medida de aumentar a taxação sobre livros. Para o socialista, "o governo já elegeu seu novo inimigo: o livro

Guedes já disse que pobre não lê

O argumento de que pobres brasileiros não leem já havia sido utilizado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes. Ele chegou a afirmar em agosto de 2020 que a doação direta de livros é mais eficiente que a concessão de benefícios fiscais a editoras. "Vamos dar o livro de graça para o mais frágil, para o mais pobre. Eu também, quando compro meu livro, preciso pagar meu imposto. Então, uma coisa é você focalizar a ajuda. A outra coisa é você, a título de ajudar os mais pobres, na verdade, isentar gente que pode pagar?, disse o ministro na ocasião.

A Receita argumenta ainda que não existem avaliações que indiquem que houve redução do preço dos livros após a concessão da isenção. "Não foi identificada nem correlação entre uma coisa e outra?, acrescenta o texto.

Não é só rico que lê

Após o documento com perguntas e respostas da Receita Federal ser divulgado, o Sindicato Nacional dos Editores de Livros (Snel), com base em levantamentos realizados para o setor, rebateu o argumento de que só ricos consomem livros não-didáticos e afirmou que o preço médio do livro caiu 40% desde 2004.

Em nota enviada ao jornal O Estado de S. Paulo, o presidente do Snel, Marcos da Veiga Pereira, afirmou que o consumo de livros não didáticos é dividido 50% entre as famílias com renda acima e abaixo de 10 salários mínimos, segundo o quadro 1.1.1 da POF de 2017-2018.

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A Câmara Brasileira do Livro (CBL) comentou que a pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, realizada pelo Instituto Pró-Livro em parceria com o Itaú Cultural, mostra que existe um contingente de 27 milhões de brasileiros das classes C, D e E que são consumidores de livros. 

Justificativa da Receita piora o que já é ruim

O especialista em educação e orçamento, João Marcelo Borges, afirmou à CNN Brasil que a justificativa da Receita é elitista e piora a situação que já é ruim no país. "Os livros no Brasil já são caros, o que por si só já afasta as pessoas mais pobres, e torna mais caros?, diz Borges. Segundo ele, a ideia de tributar mais os ricos se aplica a "iates, helicópteros e outros produtos consumidos pela classe mais alta? e não a livros.

Na avaliação do advogado tributarista Fernando Raposo Franco, o argumento ainda cria uma distorção, uma vez que a CBS incidirá não apenas sobre livros não-didáticos, mas também sobre os didáticos. "Se prosperar a proposta do governo, corremos o risco de que essa política de incentivo ao acesso a bens culturais e educacionais da relevância dos livros seja extinta sem que nada mais focalizado e eficiente seja posto no lugar?, disse à Folha de S. Paulo.

Além disso, sobre o argumento de que "a tributação dos livros permitirá que o dinheiro arrecadado possa ser objeto de políticas focalizadas no âmbito da CBS?, Pereira discorda. "Até parece. Nunca o Brasil investiu em Cultura e Educação, o resultado está refletido nas posições vergonhosas que ocupamos no IDH e no PISA?.



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